Discutindo com um amigo o livro Joy Inc. - livro que narra como Richard Sheridan transformou sua empresa, Menlo Innovations, em um lugar feliz de se trabalhar, - ouço a frase “É basicamente o livro que Michael Scott queria ter escrito”. Não pude evitar amar essa colocação, por mais errada que ela possa ser.
Michael Scott
Michael Scott, personagem da consagrada sitcom “The Office”, é o gerente de uma filial da fictícia empresa de papel Dunder Mifflin Inc. Ao longo de seu desenvolvimento é descoberto em Michael alguém sensível, que se importa com a felicidade de seus funcionários, leal à sua equipe e ainda assim, em síntese, ele é um péssimo chefe.
O personagem busca, ao longo das temporadas, trazer inovações a sua filial e a corporação como um todo e realmente é possível notar como tem como um objetivo pessoal manter sua equipe feliz. O problema é que Michael, apesar de ter um bom coração, não sabe exercer bem sua posição de liderança. Seus projetos de trazerem “felicidade” ao escritório acabam trazendo apenas improdutividade e estresse. Sua tentativa de forçar um relacionamento com seus funcionários não traz nada além do desconforto.
A verdade é que o personagem foi criado justamente para isso, ser uma representação do chefe inconveniente, que possui uma própria visão distorcida sobre seu ambiente de trabalho e acredita que está fazendo algo de bom. Justamente essa representação genérica dessa persona presente no fim da década de 2000 e início da década de 10 que torna a série tão relacionável. Hoje porém temos um tipo diferente, – ainda que em essência similar, – de Michael Scott: Os chefes dos chamados “Hip Offices”.
As Startups
Talvez você não esteja familiarizado com o termo “Hip Offices”, mas provavelmente conhece o conceito. O modelo de escritório descontraído, com áreas de lazer, jogos, uma cozinha que se transforma em bar pós expediente e que incentiva seus funcionários a passarem tempo extra apenas pela diversão foi muito popularizado pelo google, seguido por diversas empresas de tecnologia e não demorou muito até se tornar o padrão buscado pela maioria das grandes startups.
Eu não estou alegando que é algo péssimo uma mesa de ping-pong em um escritório, muito menos recomendando ao Google que mude sua estrutura. O problema se dá quando as empresas – principalmente as de pequeno para médio porte, – implementam tais soluções como forma de aplacar os problemas de saúde mental de seus funcionários.
Como muito bem explicado pela revista de tecnologia e informação FastCompany na matéria “Why cool offices do nothing to mental health” de abril de 2020, os esforços para se evitar burnouts e queda de produtividade por estresse com a “modernização” do espaço de trabalho são inúteis pois o escritório em si não é a raiz do problema.
O investimento na construção de um relacionamento saudável com a equipe de trabalho e a liberdade para os funcionários se desconectarem da empresa, são exemplos de pontos que devem ser trabalhado muito antes de se considerar modificar o espaço de lazer do trabalho. A mesma revista, em outubro de 2018 já havia publicado uma excelente matéria “Ask these 4 questions rather than buy a ping-pong table for your office” que pontua ótimas observações sobre o que deve ser prioridade em uma empresa.
Em meio a tantos exemplos negativos, como então modificar o escritório ou se esforçar para trazer felicidade aos funcionários durante o trabalho pode ser visto de forma confiável ou realmente relevante? Foi com essa pergunta em mente que comecei minha leitura de Joy Inc. – o livro que trazia como subtítulo a promessa de ter construído um ambiente de trabalho que as pessoas amam.
O que eles não entenderam
Descrente que a leitura pudesse propor algo de novo, relevante e aplicável, comecei o livro “Joy Inc – How we built a workplace that people love”. Ao ler suas primeiras páginas, senti minhas suspeitas sendo concretizadas. Mais um livro me apresentaria soluções que não realmente solucionam o problema em si, ou que sejam utópicas, e simplistas, sem possibilidade de aplicação real. Eu não poderia estar mais errado.
O que Rich traz com seu livro, e todo seu modelo de negócio, é um projeto que busque a felicidade real de seus funcionários (não sua distração) e de forma que seja produtiva e benéfica a empresa como um todo.
Um dos primeiros pontos estabelecidos pelo autor foi a mudança do escritório convencional para uma grande sala conjunta, onde todos trabalham juntos. Cada um dos funcionários, junto ao chefe, trabalham juntos, no mesmo ambiente. A comunicação se torna natural e simples e o auxílio é norma entre a equipe.
Junto a isso, há o fato que os programadores – assim como todas as demais áreas da empresa, – trabalham em duplas, no chamado “Pair Programming”. As duplas têm rotatividade semanal, fazendo com que todos na equipe possam se conhecer melhor. Tal fato auxilia não apenas na integração, mas também a descobrir perfis e habilidades, com propriedade, que possam ser utilizados em certos projetos. Fora isso, o fato de duas pessoas se auxiliarem no trabalho garante que erros devidos a falta de atenção – que acabam por serem considerados inevitáveis, – são facilmente localizados e prevenidos.
Cria-se assim um ambiente leve e com mútua ajuda. Soma-se, então, a isso a organização ilustrativa e pontual da Menlo. Cada dupla estipula semanalmente quando tempo levará em cada atividade, para que possam ser organizadas no painel semanal. É visível a todos as atividades que devem ser feitas por cada dupla assim como seu andamento atual. Tendo a comunicação como chave e uma organização bem feita, os funcionários podem focar no que realmente importa, sendo mais produtivos sem sobrecarga.
Outro ponto importante são os horários. A menlo possui uma política de realmente se desconectar do trabalho fora de sua jornada, entendendo que sua equipe poderá ser mais feliz, e mais útil, focando no trabalho apenas nas horas adequadas, tendo tempo para descanso e lazer.
O livro é ótimo e demonstra um pensamento que entende realmente o que pode promover a felicidade para seus funcionários, mantendo a empresa funcional – ou melhor, melhorando a funcionalidade da empresa. Não digo que o método adotado irá substituir tudo que conhecemos hoje, ou que todos podem se adequar a ele, mas ele mostra que existem possibilidades de se inovar, e só isso já é inspirador o bastante.
Top comments (2)
Gostei muito do teu post cara! Inclusive quando comecei o livro, comecei com a mesma impressão que você, e foi se alterando a cada capítulo que eu lia.
Aah, muito obrigado! Acho que isso acontece principalmente pois o autor detalha bem a organização da empresa, o que torna a ideia mais tangível.