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Izaias Miguel for Virtual360

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Resumo: Creative Selection

Esse livro estava em minha estante há uns 2 anos e ainda não tinha conseguido priorizar. Finalmente consegui ler e achei bem interessante, com alguns pontos a compartilhar.

O livro basicamente conta algumas estórias bem bacanas dos bastidores da criação de novos produtos pela Apple. O autor foi engenheiro de software lá entre 2001 e 2017, passando ainda pelo AirBnB depois disso.

Por ter sido escrito por alguém que trabalhou no código de alguns dos principais produtos da Apple no período, o livro traz uma visão mais técnica que me chamou bastante atenção (dada minha formação em Ciência da Computação). Tem até um trecho de código em C++, rs.

O autor, Ken Kocienda, foi um dos responsáveis pela criação do Safari, do envio e visualização de e-mails em HTML pelo Mail, e pela criação do teclado do iPhone (e mais tarde do iPad). Portanto, produtos essenciais no ecossistema da Apple.

O Safari foi lançado em 2003 apenas - antes dele, poucas pessoas se lembram, mas o browser do Mac era o Internet Explorer da Microsoft. O teclado era um dos principais riscos para o lançamento do iPhone, pois uma das principais inovações à época era justamente ser um telefone sem teclado, concorrendo com o famoso teclado do Blackberry (além do fato de que o input de dados era um dos principais traumas da Apple em dispositivos móveis, dado que tinha sido um dos principais fatores de insucesso do Newton na década de 90).

Em resumo, o autor cita como principais fatores de sucesso na criação dos produtos da Apple: a cultura da empresa, a estrutura dos times e o processo de inovação.

Sobre a cultura, ele cita sete elementos essenciais para o sucesso dos softwares da Apple, dando exemplos desses pontos ao longo das estórias, que conta:

  • Inspiração: pensar em grandes ideias e imaginar o que poderia ser possível
  • Colaboração: trabalhar em conjunto com outras pessoas e buscar combinar suas forças complementares
  • Habilidades (craft): aplicar habilidades para atingir resultados de alta qualidade e sempre tentar fazer melhor
  • Diligência: fazer o trabalho chato necessário e nunca recorrer a atalhos ou meias medidas
  • Agilidade na tomada e decisão (decisiveness): fazer escolhas difíceis e se recusar a atrasar ou procrastinar
  • Gosto (taste): desenvolver um senso refinado de julgamento e achar o equilíbrio que produz um todo prazeroso e integrado
  • Empatia: tentar ver o mundo na perspectiva de outras pessoas e criar um trabalho que se encaixe em suas vidas e se adapte à suas necessidades

Esses princípios não estavam escritos em lugar nenhum, nem eram passados aos recém-contratados. Mas, fluíam do trabalho tanto top down, a partir da liderança do Steve Jobs, quanto bottom-up, a partir dos engenheiros.

Sobre a estrutura dos times, o autor reforça que sempre eram times muito pequenos, onde os próprios engenheiros eram responsáveis pelo produto, da ideação à codificação - não havia um “product manager”.

Apenas 10 pessoas trabalharam no Safari e apenas 25 foram responsáveis por todas as patentes do iPhone. Eles quebravam o software em diversas pequenas partes que se falavam muito pouco. Por exemplo, o Ken como responsável pelo teclado do iPhone, não sabia absolutamente nada sobre o que estava sendo feito em termos de hardware, só trabalhava com um protótipo da tela conectado a um computador.

Em relação aos demais softwares do iPhone, a interação de Ken era basicamente fazer com que as pessoas que criavam aplicativos, como Notas e E-mail, usassem o teclado e dessem feedbacks ao longo do uso. Além da compartimentalização em pequenos times, a Apple ainda tinha uma preocupação muito grande com o sigilo, de forma que poucas pessoas tinham acesso ao todo.

O processo de desenvolvimento é a principal ênfase do livro. O autor cita o processo que ele denominou de “Seleção Criativa”, é basicamente a criação rápida de protótipos que são validados pela alta liderança da empresa, e em alguns momentos pelo próprio Steve Jobs. Esses protótipos são sempre funcionais - eles não “perdem tempo” criando documentos ou protótipos não funcionais, pois segundo ele é muito difícil provar a viabilidade e usabilidade de algo que as pessoas não estão usando.

Esse ciclo de criação rápida de protótipos funcionais, feedback pela alta liderança e ajustes no protótipo com base nos feedbacks, permite que o time fique focado em entregar código tendo retornos muito rápidos e foque no que é importante para o usuário, o que casa muito com os princípios de agilidade.

Ken cita ainda a diferença dessa abordagem para a de empresas como o Google, que foca muito em fazer testes A/B para tudo e em lançar produtos não tão maduros ainda para receber feedback dos usuários. Na Apple, os próprios times são responsáveis pela tomada de decisão, dado que a cultura é de lançar produtos já maduros e que praticamente não foram testados com usuários “reais” pelo sigilo que a empresa impõe. Essa diferença é muito ressaltada pelos aspectos culturais de decisiveness e taste, onde os próprios engenheiros tomam decisões o tempo todo pelos usuários da Apple.

O autor ainda dá ênfase às demonstrações de produtos para Steve Jobs. Nessas demonstrações ele sempre estava com a atenção totalmente focada e pedia a opinião do apresentador sobre o que ele achava de algo (ex: retirar um dos dois templates de teclado do iPad). Steve sempre prezava pela simplicidade que ajudava o usuário a usar e retirava toneladas de complexidade do desenvolvimento. Quando pedia a opinião, era para ensinar as pessoas a pensarem sobre o produto com a mesma cabeça que ele, em vez de só dizer como deveria ser.

Eram muitas demos, então ele prezava por comunicação direta e concisa, sem rodeios. Além disso, ele sempre dava um foco único para o time - no caso do Safari por exemplo, ele queria que o browser fosse muito mais rápido que os demais, o que fez com que o time focasse totalmente em não adicionar nada que aumentasse o tempo de resposta e trabalhasse arduamente para remover todos os gargalos.

Em qualquer atividade complexa, comunicar uma visão bem articulada para o que você está tentando fazer é o ponto inicial para descobrir como fazer. Embora criar essa visão seja difícil, é muito mais difícil completar todo o circuito: ter uma ideia, um plano para realizá-la e executar o plano com altos padrões, tudo sem se atolar ou mudar a direção.

Ter um único objetivo para ser excelente é muito importante para atingir a excelência. Quando foi lançado, o Safari era 3x mais rápido que os demais browsers.

*Conclusão *

Achei muito legal tanto para conhecer mais a estória de alguns dos produtos mais icônicos da Apple (depois disso não consigo mais digitar no teclado do iPhone sem pensar de forma um pouco mais profunda sobre o que está por trás) quanto por conhecer o interior da Apple. Para mim, ela sempre foi uma das maiores caixas pretas em termos de estrutura e processo de inovação. Vale muito a leitura para quem se interessa pelo tema.

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