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Eduardo Klosowski
Eduardo Klosowski

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Criando e executando contêineres Docker ARM em arquitetura AMD64

Cada vez é mais comum encontrar ambientes com a arquitetura ARM, seja um Raspberry Pi ou servidores na nuvem buscando reduzir custos, ou até mesmo no Apple M1. Ela difere da arquitetura mais comumente encontrada nos computadores (AMD64 também conhecido por x86_64). Essa diferença gera dificuldades para criar e executar contêineres de um ambiente em outro, dado que essas arquiteturas não possuem nativamente um modo de compatibilidade. Esse texto discutirá como executar programas para a arquitetura ARM em computadores AMD64, e como isso pode ser utilizado para gerar e executar imagens Docker.

Como executando programas de outra arquitetura?

Para se executar algo em qualquer arquitetura deve existir um programa com instruções que a CPU entenda. Operações similares podem ter instruções completamente diferentes em diferentes arquiteturas, e as arquiteturas podem ter desenhos diferentes de hardware, como variação na quantidade e tamanho dos registradores. Essas diferenças geram incompatibilidades e não permitem que um programa compilado para uma arquitetura seja executado em outra.

Porém, como existem operações similares, ou formas de se conseguir resultados equivalentes em diferentes arquiteturas, é possível adicionar uma camada que traduza as instruções de uma arquitetura para seu equivalente na arquitetura da CPU onde deseja-se executar o programa.

Um programa que faz essa tradução das instruções é o QEMU, que pode ser usado tanto para emular ou virtualizar tanto uma máquina inteira (máquina virtual) quanto apenas um processo. Nesse caso, como serão executados apenas programas para Linux trocando a arquitetura do processador, é possível emular apenas um processador ARM para esses programas, sem a necessidade de emular ou virtualizar uma máquina virtual inteira, o que incluiria até o sistema operacional.

Para instalar esse emular no Debian (ou derivados como Ubuntu) existe o pacote qemu-user, porém ele é compilado de forma a carregar diversos arquivos .so (o equivalente as .dll do Windows), e como deseja-se executar contêineres, que fazem chroot como já expliquei na série Isolamento de aplicações, deve-se optar pela opção que inclui as funções dos .so no próprio binário, oferecida pelo pacote qemu-user-static. Isso permite executar um programa compilado para ARM 32 bits chamando o emulador e passando o binário como argumento, exemplo qemu-arm-static ./programa, ou qemu-aarch64-static ./programa para ARM 64 bits.

Também é possível usar a interface do módulo binfmt_misc para informar ao kernel Linux, que quando for solicitado para ele executar um programa para ARM, isso deve ser feito através desse emulador. No Debian essa configuração é feita automaticamente pelo pacote do QEMU, bastando ter o pacote binfmt-support instalado (ele também pode ser instalado depois do QEMU). Para verificar essa configuração é possível executar o comando update-binfmts --display qemu-arm como root, ou ler o arquivo /proc/sys/fs/binfmt_misc/qemu-arm com qualquer usuário, e trocando qemu-arm para qemu-aarch64 para testar a configuração de 64 bits. Segue um exemplo dessas configurações (observe o interpretador configurado, que é um link simbólico para o QEMU):

# update-binfmts --display qemu-arm
qemu-arm (enabled):
     package = qemu-user-static
        type = magic
      offset = 0
       magic = \x7f\x45\x4c\x46\x01\x01\x01\x00\x00\x00\x00\x00\x00\x00\x00\x00\x02\x00\x28\x00
        mask = \xff\xff\xff\xff\xff\xff\xff\x00\xff\xff\xff\xff\xff\xff\xff\xff\xfe\xff\xff\xff
 interpreter = /usr/libexec/qemu-binfmt/arm-binfmt-P
    detector =
Enter fullscreen mode Exit fullscreen mode
$ cat /proc/sys/fs/binfmt_misc/qemu-arm
enabled
interpreter /usr/libexec/qemu-binfmt/arm-binfmt-P
flags: POCF
offset 0
magic 7f454c4601010100000000000000000002002800
mask ffffffffffffff00fffffffffffffffffeffffff
Enter fullscreen mode Exit fullscreen mode
$ ls -la /usr/libexec/qemu-binfmt/arm-binfmt-P
lrwxrwxrwx 1 root root 25 set 29 07:14 /usr/libexec/qemu-binfmt/arm-binfmt-P -> ../../bin/qemu-arm-static
Enter fullscreen mode Exit fullscreen mode

Assim ao executar o comando apt install qemu-user-static binfmt-support se torna possível executar um programa compilado para ARM de forma transparente, como se fosse nativo, exemplo ./programa.

Criando e executando contêineres Docker

Se a instalação e configuração do QEMU foi feita corretamente, já é possível usar contêineres ARM, bastando informar a arquitetura com o parâmetro --platform linux/arm64 ao executar os comandos do Docker, exemplo docker run --platform linux/arm64 -it --rm alpine. Isso pode ser confirmado executado o comando uname -m dentro e fora do contêiner mostrando qual a arquitetura do sistema.

Caso ao executar algum comando do Docker ocorra um erro parecido com standard_init_linux.go:228: exec user process caused: exec format error, recomendo voltar e revisar a configuração do QEMU e binfmt_misc, visto que o Docker não conseguiu executar o programa dentro do contêiner.

Um detalhe a ser observado é que existe uma imagem chamada alpine:latest para AMD64 e outra para ARM, e ao fazer o pull de uma, ela vai retirar a tag da outra se existir no sistema, então é sempre bom verificar antes qual a imagem que existe localmente ou fazer pull para evitar misturar as imagens, o que causaria erros. A baixo um exemplo do docker image ls ao executar o pull tanto da imagem ARM quanto AMD64:

REPOSITORY   TAG       IMAGE ID       CREATED        SIZE
alpine       <none>    8e1d7573f448   3 months ago   5.33MB
alpine       latest    c059bfaa849c   3 months ago   5.59MB
Enter fullscreen mode Exit fullscreen mode

Seguindo o que foi visto até aqui, para se criar uma imagem para ARM pode-se utilizar o comando docker build --platform linux/arm64 --pull -t <nome_imagem> ., e trocando linux/arm64 por linux/amd64 criar a mesma imagem para AMD64, desde que no repositório de imagens (Docker Hub por exemplo) existam as imagens usadas como base para ambas arquiteturas com o mesmo nome e tag. Também é válido observar que se as imagens geradas tiverem o mesmo nome, a última imagem gerada vai sobrescrever a tag da anterior, que se torna acessível apenas pelo ID.

Uma alternativa ao parâmetro --platform é a variável de ambiente DOCKER_DEFAULT_PLATFORM. A vantagem dessa opção é que ela pode ser definida em algum arquivo de configuração, como no ~/.bashrc, adicionado export DOCKER_DEFAULT_PLATFORM=linux/arm64, e deixa de ser necessário informar o parâmetro --platform toda vez que o Docker for executado.

Considerações

Embora as arquiteturas AMD64 e ARM não sejam compatíveis é possível utilizar o QEMU para fazer a execução de programas ARM em CPUs da arquitetura AMD64. Porém, como isso é feito por software, e não pelo hardware, pode ocorrer problemas de desempenho, o qual ainda deve ser verificado.

Dado que o sistema consegue executar programas ARM de forma transparente, isso se reflete no Docker, permitindo tanto criar imagens para ARM, quanto executá-las, bastando observar a limitação da lincagem dinâmica com arquivos .so devido ao chroot que ocorre.

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