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Ricardo Gouveia
Ricardo Gouveia

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O front-end vai mudar. Assim como todas as profissões e maneiras de se trabalhar

Não deixa o front morrer. Não deixa o front acabar.

Antes de tudo, entre aqui e veja se o front já acabou. Se já tiver acabado, este texto é inútil.

O assunto que eu quero discutir já está maduro. Ele envolve textos (pelo menos 2), threads, tretas, e pessoas. Talvez ele nem devesse ser discutido mais. Mas ele tem potencial para causar impacto negativo numa comunidade de pessoas que a cada dia se torna mais receptiva, inclusiva, e — se posso dizer—maravilhosa.

Faça-se a treta

Tudo começou quando certo profissional, que — apesar de já ter publicado um (excelente) livro sobre desenvolvimento front-end—na época não intitulava-se mais desta area, publicou um texto com o título "O fim da profissão front-end". Esse texto discorre sobre os deveres de um desenvolvedor front-end (no caso, essencialmente implantar layout e conectar tal com APIs/back-ends) e que a automação pode tornar possível a conversa entre designers e back-ends.

Como argumentos, cita-se ferramentas de conversão layout-html, html-layout, aberturas de formatos de arquivos, etc.

Do texto para a thread

O texto bateu com o cajado no chão e dividiu a comunidade em várias partes. Tinha gente querendo desistir. Tinha gente querendo reparar o estrago que o texto tinha feito; e tinha gente (eu) procurando foto da Alcione pra fazer referência/meme a/com música.

Falando sério, eu achei o texto simplesmente ridículo logo após a leitura do título. Por quê? Porquê é clickbait. E por mais que clickbait seja algo que já exista um certo consenso para que não seja levado a sério, este surgiu num site de autoridade, com autor de autoridade, e não era primeiro de abril.

As ferramentas que a argumentação cita fazem sentido quando temos uma percepção simplificada do que um desenvolvedor front-end faz. E a introdução faz muito bem o trabalho de simplificar o que não deve ser simplificado. Ela te prepara para ouvir e aceitar uma mentira.

Sim, devs front-end implementam layouts. Mas isso não é simples. Quase ninguém contrata front-end pra escrever header, footer, main e aside. Vivemos num mundo com Wordpress.

Basicamente, os times de front existem em duas situações: otimização máxima e disrupção máxima.

Os times de front-end que lidam com otimização máxima trabalham em empresas com tráfegos exorbitantes em seus sites. É uma situação onde cada milissegundo conta. Conta usuários, conta dinheiro, conta empregos.

Por vezes, as soluções de otimização desenvolvidas por esses grupos desafiam toda lógica por trás da idéia de otimização. Imagine tornar algo mais rápido tornando-o maior… isso é possível com software.

O fato é que, se a otimização fosse possível a este nível conservando a abstração tão alta a ponto de não termos necessidade de intervenção humana no código, jamais teríamos saído da era do Dreamweaver (e hoje temos o Wix).

Os times que lidam com disrupção máxima manipulam sites cujo layout pode até não seguir uma lógica semântica. Isso acontece muito em portfolios mirabolantes, mas nada impede de criar-se sites institucionais, e-commerces, e etc assim. Existem outras maneiras de guiar o usuário através de um fluxo de navegação.

Grande parte das vezes, esses times travam batalhas entre o design e semântica, e entre o design e acessibilidade. Os produtos dependem de animações, apresentam efeitos visuais que o próprio designer duvidava ser possível no browser, e sofrem com falta de tags adequadas para uso nos elementos do HTML.

Existe, e provavelmente por muito tempo continuará existindo, um limite até onde a automação pode compreender o produto da criatividade de um designer, e adapta-lo para código. Inteligência artificial, machine learning… tudo isso leva em consideração padrões. Logo, como podemos esperar que isto replique algo que foge dos padrões? (eu sei de lógica fuzzy… mas, você conhece alguma aplicação centrada em design?).

A profecia

Infelizmente sou um trouxa (aquele que não é bruxo em Harry Potter), não tive aulas de adivinhação com Sibila Trelawney. Mas pelo que conheço dela, ela é uma pessoa legal e já teria avisado se tivesse visto o fim da nossa profissão nas borras de chá de alguém.

Dizer que algo que não lhe pertence vai acabar é errado. Isso, porque muito provavelmente a quantidade necessária de domínio sobre tal objeto para que essa afirmação tenha um mínimo de chance de se concretizar é sobre-humana. E se você faz algo do tipo desrespeitando essa assertiva, você está mentindo (e não se deve contar mentiras, Dolores).

A profissão de desenvolvedor front-end está suscetível a mudanças, assim como qualquer outra. Estas tendem a ser mais rápidas pelo fato do front-end ser inerente a tecnologia, ao software, e a web. Mas isso é algo que os profissionais da área já entenderam bem após tantas piadas com frameworks javascript.

A quantidades de empresas que só existem digitalmente só aumenta.

É obrigação do profissional front-end entender as intersecções da sua profissão. Entender que ele é o profissional de interação humano-computador da web, e que a interação entre seres vivos e máquinas só vai acabar quando uma das duas formas estiver extinta.

O nome front-end já deixa claro que não somos webdesigners. Quase toda aplicação tem front-end. E no dia que não houverem mais dispositivos do tipo smartphones, computadores, etc… e a informação for recebida e transmitida diretamente do cérebro, bem, ela ainda precisa ser mostrada de uma maneira para o cérebro, não é mesmo?

A interação nunca vai morrer

Houve uma época onde ser desenvolvedor front end poderia ser reduzido a bater tecla. Mas essa era ficou para trás. Temos muitas obrigações além de digitar código.

Quando uma disrupção/automatização ocorre, uma profissão pode sim morrer. Mas isso não significa que toda prática e conhecimento dela seja imediatamente inutilizado. Se o Uber matar o táxi, ainda será necessário saber-se dirigir.

Devemos atender as necessidades do agora, do mercado e da sociedade. E agora, precisamos de desenvolvedores front-end. No futuro, precisaremos de especialistas que acompanhem, manipulem, desenvolvam e otimizem novas formas de interagir com sistemas. E no dia que a máquina conseguir compreender as sutilezas dessa interação melhor que um humano (ou seja, entender o ser humano melhor do que ele mesmo), certamente a Skynet já estará ligada.

Daniel Filho já disse: queime seus ídolos. E chega de texto, tem mais framework pra estudar.

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