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Vitor Lobo
Vitor Lobo

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O Valor do Aprendizado Prático com um Home Lab On-Premise

No cenário tecnológico atual, a agilidade oferecida pela computação em nuvem e pelos serviços SaaS (Software as a Service) é inegável.

Essas plataformas abstraem complexidades — do provisionamento de servidores à configuração de redes e balanceadores — através de interfaces amigáveis e APIs.

Embora isso aumente a produtividade, também pode mascarar detalhes técnicos cruciais, resultando em um aprendizado superficial.

Ao utilizar serviços gerenciados, raramente lidamos com sistemas operacionais diferentes, endereços IP ou discos físicos.

Em contrapartida, construir uma infraestrutura on-premise (com seu próprio hardware) revela toda a profundidade do "iceberg" tecnológico: do BIOS ao DNS, nada permanece oculto.


☁️ A Conveniência da Nuvem e a Abstração

Serviços de nuvem são extremamente convenientes. Com poucos cliques ou linhas de código, é possível criar uma VM (Máquina Virtual), um banco de dados ou um cluster Kubernetes.

Porém, essa facilidade é resultado da abstração, que oculta toda a engenharia por trás — uma rede complexa de hypervisors, switches virtuais, SANs e bootloaders. Essa “mágica” pode levar profissionais, principalmente iniciantes, a pularem etapas fundamentais de aprendizado, focando apenas em ferramentas e arquivos YAML, sem compreender a pilha tecnológica completa.

Em um ambiente on-premise caseiro — o famoso homelabnão há atalhos. A jornada é “hard way”, enfrentando a infraestrutura de forma holística. Você instala sistemas, configura redes, gerencia storage e mantém serviços ativos.

Essa prática proporciona controle total da stack, permitindo entender como cada camada se integra. Um homelab oferece liberdade total para experimentar (e quebrar coisas) sem medo de custos inesperados ou políticas corporativas. É possível criar 10 VMs apenas para testar algo, sem ansiedade de billing, algo inviável na nuvem pública.

Outra vantagem é poder tocar em cada componente do sistema.

Diferente da cloud, onde há restrições de acesso, no seu laboratório você pode inspecionar serviços, logs e métricas diretamente.

A nuvem entrega resultados rápidos. O homelab ensina os sistemas por trás desses resultados — formando engenheiros mais versáteis, resilientes e curiosos.

A construção de um homelab traz benefícios tanto educacionais quanto práticos. Lembro de uma palestra do amigo Ricardo Pchevuzinske Katz, em que ele dizia que a melhor forma de aprender sobre um componente do Kubernetes é desligando-o e observando o que quebra.

Essa ideia faz total sentido pra mim — porque é justamente quando tudo para, é que a gente entende como as partes realmente se conectam. Ter a chance de experimentar isso em um ambiente controlado é simplesmente o cenário ideal para aprender de verdade.


🖥️ Meu Homelab Pessoal com FreeBSD

Recentemente montei um homelab em FreeBSD para experimentar e validar conceitos de virtualização, redes, segurança, observabilidade e automação, de forma totalmente independente da nuvem pública.

A ideia é construir em casa um ambiente moderno e minimalista, porém completo, que me permita validar tecnologias de infraestrutura.

No ambiente, utilizo recursos nativos do FreeBSD como base da infraestrutura para simular clusters e topologias completas de produção. Por exemplo, estou utilizando o Jails para gerenciar contêineres onde cada jail roda aplicações de forma independente, permitindo simular múltiplos nós ou serviços no mesmo host.

Além disso, tenho experimentando o uso do bhyve – o hipervisor nativo do FreeBSD e com ele executo outros sistemas operacionais ou kernels personalizados, ampliando os cenários de teste.

Algo bastante interessante também é o sistema de arquivos nativo o ZFS – que me dá suporte autogerenciado a snapshots, clones e checksums. Uso o ZFS para criar e restaurar rapidamente estados do sistema e simular topologias complexas de armazenamento.

Essa combinação — Jails, bhyve e ZFS — me dá flexibilidade para orquestrar múltiplos ambientes isolados no mesmo servidor físico.

Como Sec nunca foi meu forte, implementei segmentação de rede e políticas de segurança usando a camada pfSense que roda nativo no FreeBSD. Com ele tenho experimentado gerenciar VLANs, NAT e regras de filtragem por meio do pf (Packet Filter).

Além disso, consigo observar comportamentos de Regras de isolamento entre zonas de rede (desenvolvimento, produção simulada etc.),Políticas de QoS e NAT para controle de tráfego, e Proxy revers para inspeção de tráfego em camadas L3/L7.

Essa abordagem me permite enxergar o fluxo de pacotes do kernel até a aplicação, integrando firewall, proxy e métricas de rede de forma unificada.

Outro complemento interessantíssimo nessa jornada, tem sido o entendimento a cerca do comportamento interno do sistema usando BPF (Berkeley Packet Filter) para captura e análise de pacotes em tempo real diretamente no kernel.

Pretendo em breve escrever mais sobre esta experiência e com mais detalhes.

Com ele, analiso latência entre jails, fluxos TCP e impactos de políticas de firewall com muito mais confiabilidade do que alto nível (como geralmente fazemos). Utilizo o DTrace para correlacionar métricas do kernel com comportamento de aplicações sob carga.

Essas ferramentas me permitem observar a infraestrutura no nível mais profundo, extraindo métricas diretamente da pilha BSD e correlacionando dados de kernel, rede e aplicação.

🧩 Engenharia de Resiliência

No homelab, realizo testes de falhas controladas para estudar resiliência e comportamento sob carga, simulando:

  • Falhas de rede e perda de pacotes com regras no pf
  • Reinícios e travamentos de jails propositalmente
  • Sobrecarga de I/O e CPU com stress tools nativas

Esses experimentos ajudam a entender como o sistema reage a falhas e a identificar gargalos em backoff, failover e reconciliação de estado — conceitos fundamentais em sistemas distribuídos.

Hardware

Apesar de saber que o ideal seria usar uma estrutura de servidor ainda que leve, atualmente, o meu homelab roda em uma máquina comum AMD Ryzen 7 7700X (8 núcleos / 16 threads) e 32 GB de RAM DDR5, expansível até 128 GB — um upgrade para 64 GB já está planejado para breve.

Utilizo uma GPU AMD Radeon RX 7600 XT com 16 GB de VRAM, o que me permite explorar modelos de linguagem (LLMs) localmente. Inclusive, soube a pouco que placas AMD no FreeBSD geram menos transtornos.


🧠 Conclusão

Construir um home lab na minha opinião, é um exercício de engenharia real. Ele acelera o aprendizado, amplia sua visão técnica e desenvolve habilidades que vão muito além de tutoriais ou certificações.

Profissionais com esse tipo de experiência se destacam pela curiosidade, resiliência e autonomia técnica — qualidades fundamentais para quem trabalha com SRE, cloud, automação e engenharia de plataforma e engenharia de software também.

Acredito que a nuvem é o futuro. Mas compreender o que está abaixo dela é o que forma engenheiros verdadeiramente excepcionais.

Embora este artigo possa soar como um material voltado a SREs ou engenheiros de DevOps, ele nasce da visão prática de um desenvolvedor.

Afinal, SRE e DevOps sem Dev nem sentido fazem. O objetivo aqui não é apenas discutir automação, resiliência ou infraestrutura — mas entender o que realmente acontece por baixo da abstração, onde o software encontra o sistema operacional e o hardware. É a partir dessa visão que a engenharia ganha profundidade.

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