Estou de volta com reflexões que sempre surgem em conversas com amigos da comunidade. A diferença entre DevX e DevRel. Antes de tudo, vale lembrar que, se você for usar algo desse conhecimento, mencione os autores em seu texto e em suas palestras :)
Entenda-se aqui "pessoa desenvolvedora" como qualquer pessoa envolvida na engenharia de sistemas. Um dia a gente troca a forma para pessoa da engenharia :)
Este texto é baseado em dois trabalhos fundamentais:
- An Actionable Framework for Understanding and Improving Developer Experience (Greiler, Storey e Noda) – refere-se ao contexto interno de times e organizações;
- A Developer Relations (DevRel) Model to Govern Developers in Software Ecosystems (DevGo) (Fontão et al.) – refere-se ao contexto sociotécnico de ecossistemas, abrangendo tanto relações internas (entre times, engenharia e produto) quanto relações externas com comunidades e plataformas.
DevX e DevRel: Conexões, Limites e o Papel Estratégico da Ponte
Se a empresa trata DevX e DevRel como a mesma coisa, ela acaba não fazendo bem nenhum dos dois.
A distinção entre Developer Experience (DevX) e Developer Relations (DevRel) é, antes de tudo, uma distinção entre camadas de atuação. DevX concentra-se na vivência interna da pessoa desenvolvedora: seu fluxo, sua fluidez, suas barreiras e suas percepções. O DX Framework demonstra que a experiência é influenciada tanto por fatores técnicos, como pipelines e arquitetura, quanto por fatores sociais, como suporte, colaboração e reconhecimento. Já DevRel atua no nível sociotécnico, governando relações entre pessoas desenvolvedoras, produto, engenharia e comunidades. Essa governança ocorre tanto dentro da organização (alinhando expectativas, conhecimento e práticas entre times) quanto fora dela (comunidades, parceiros, contribuidores). O DevGo descreve DevRel como uma área que estrutura transferência de valor nesses fluxos, sustentando um ciclo contínuo de evolução compartilhada.
Recomendações práticas:
• Antes de estruturar DevRel, mapeie o estado atual de DevX. Se o fluxo interno estiver frágil, DevRel não terá base para construir confiança.
• Não posicione DevRel dentro de marketing corporativo. Posicione perto de produto e engenharia.
• Ao comunicar DevRel internamente, enfatize que a função é estratégica e sociotécnica, não apenas de alcance ou visibilidade.
DevX é Interno. DevRel é Ecossistêmico.
DevX acontece na mesa de trabalho. DevRel acontece na teia de relações que conecta essas mesas entre si e com o mundo.
DevX é vivenciado no cotidiano da engenharia. É sobre como a pessoa desenvolvedora sente o fluxo de desenvolvimento: se há fricção, se há clareza, se há autonomia e se há segurança psicológica para explorar soluções. O DX Framework evidencia que DevX melhora quando a arquitetura é compreensível, quando existe suporte entre pares, quando a documentação é confiável e quando a tomada de decisão técnica é transparente. Já DevRel se orienta por relações sociotécnicas: entre times internos, engenharia e produto, universidades, especialistas, parceiros e contribuidores externos. O DevGo demonstra que DevRel sustenta a vitalidade do ecossistema ao apoiar ciclos de engajamento contínuo, reconhecimento e evolução orgânica.
Recomendações práticas:
• Para melhorar DevX: adote revisões de código colaborativas, documentação viva, automação sensata e clareza nas decisões arquiteturais.
• Para fortalecer DevRel: estabeleça comunidades internas de prática, programas de contribuição e canais de suporte e trocas técnicas transparentes.
• Para alinhar os dois: garanta que aquilo que a comunidade externa vê seja coerente com aquilo que a equipe interna vive. Não prometa fluidez externa que não existe internamente.
Onde DevX e DevRel se Encontram
DevX prepara o terreno. DevRel conecta esse terreno a um ecossistema que cresce junto.
Quando DevX é saudável, contribuir para o produto é possível e prazeroso. Isso vale para contribuições internas e externas. DevRel traduz esse potencial em valor compartilhado, criando mecanismos para que conhecimento, práticas e melhorias circulem entre times e comunidades. A colaboração se torna cíclica: o produto melhora internamente, a comunidade interna e externa se engaja, e o aprendizado retorna para dentro. Sem DevX, a contribuição encontra barreiras e frustração. Sem DevRel, a melhoria interna não se converte em engajamento duradouro.
Recomendações práticas:
• Mapeie pontos de atrito no onboarding de novos desenvolvedores e, a partir disso, desenhe caminhos para contribuição interna e externa.
• Crie “trilhas de contribuição iniciante” com exemplos pequenos e bem guiados.
• Use feedback de comunidades internas e externas como insumo real de priorização do backlog.
O Papel Estratégico da Ponte
Ser ponte não é traduzir. É alinhar ritmos, expectativas e incentivos.
A ponte entre DevX e DevRel é uma prática de coordenação sistêmica. É ler sinais internos (fricções, motivações, capacidades) e sinais externos (demandas, tendências, oportunidades) e transformá-los em alinhamento estratégico. O DevGo mostra que advocacy não é “defender desenvolvedores”, mas traduzir necessidades técnicas em termos que façam sentido para negócios e produto. Da mesma forma, evangelismo não é “falar da empresa para fora”, mas criar condições para que as comunidades internas e externas ampliem e fortaleçam o valor técnico.
Recomendações práticas:
• Mantenha uma cadência de reuniões entre Produto, Engenharia e DevRel para alinhamento de sinais internos e externos.
• Estruture um mapa público de prioridades ou roadmap comentado.
• Torne explícitas as decisões que incorporam feedback da comunidade e também as que não incorporam, com justificativa técnica.
Medindo Impacto de Forma que a Organização Reconheça
Atividade mostra movimento. Impacto mostra transformação.
Segundo o DX Framework, DevX tem impacto sobre retenção, bem-estar e eficiência percebida. Já o DevGo orienta avaliar DevRel pela qualidade e sustentabilidade das relações sociotécnicas, internas e externas, e não apenas pela quantidade de interações ou eventos. Métricas eficazes observam continuidade, profundidade e reciprocidade.
Recomendações práticas:
• Para DevX: acompanhe tempo de onboarding, lead time de desenvolvimento e recorrência de fricções técnicas.
• Para DevRel: acompanhe contribuições significativas, integração de feedback ao roadmap e evolução das comunidades internas e externas.
• Para a ponte: documente casos concretos de redução de atrito interno e aumento de colaboração contínua.
take-home message
Separados, DevX e DevRel entregam pouco. Juntos, constroem ecossistemas vivos.
DevX atua na experiência de quem constrói.
DevRel atua nas relações que sustentam essa construção.
A ponte coordena o ciclo que transforma experiência em valor reconhecido.
DevX sem DevRel resulta em eficiência isolada.
DevRel sem DevX resulta em narrativa sem base.
DevX + DevRel resulta em evolução sustentável, contínua e compartilhada.
Top comments (1)
Sempre ótimas postagens. E sobre DevRel é autoridade .
Parabéns!!